ESTATUTO DA CIDADE - Para compreender

Itens

Apresentação

Introdução

Diretrizes gerais

Gestão democrática da cidade

Plano diretor

Instrumentos previstos

Parcelamento, edificação ou utilização compulsórios

Imposto predial e territorial urbano progressivo no tempo

Desapropriação com pagamento em títulos da dívida pública

Usucapião especial de imóvel urbano

Direito de superfície

Direito de preempção

Outorga onerosa do direito de construir

Transferência do direito de construir

Operações urbanas consorciadas

Estudo de impacto de vizinhança

Contribuição de melhoria

Incentivos e benefícios fiscais e financeiros

Desapropriação

Servidão administrativa

Limitações administrativas

Tombamento

Unidades de conservação

Zonas especiais de interessa social

 Concessão de direito real de uso

Regularização fundiária

Apresentação

 

 O Brasil é um dos países que mais rapidamente se urbanizou em todo o mundo. Em 50 anos nos transformamos de um país rural em um país eminentemente urbano, onde 82% da população moram em cidades. Este processo de transformação do habitat e da sociedade brasileira produziu uma urbanização predatória, desigual e, sobretudo, iníqua. O Estatuto da Cidade representa o encontro do país com sua face urbana, com um futuro que esperamos, irá transformar a herança do passado.

Poucas leis na história nacional foram construídas com tanto esforço coletivo e legitimidade social. Esta é a grande vitória do Estatuto que, no entanto somente se efetivará na medida em que as forças sociais que o construíram, o tornem realidade e façam valer as importantes conquistas nele contidas.

Seus princípios fundamentais: a gestão democrática; a justa distribuição dos ônus e benefícios decorrentes do processo de urbanização; a recuperação dos investimentos do poder público que tenham resultado em valorização de imóveis urbanos e o direito a cidades sustentáveis, à moradia, à infra-estrutura urbana e aos serviços públicos, confere aos municípios novas possibilidades e oportunidades de gestão e financiamento de seu desenvolvimento.

A SEDU/PR - Secretaria Especial de Desenvolvimento Urbano da Presidência da República e a CAIXA - Caixa Econômica Federal, a Câmara de Deputados por meio da CDUI - Comissão de Desenvolvimento Urbano e Interior, no exercício de suas missões institucionais, promoverão esforços para, em conjunto, com municípios, estados e demais agentes públicos e privados, implementar o Estatuto em sua globalidade, inaugurando um novo marco na administração pública brasileira, de responsabilidades sociais solidárias, na busca e materialização de uma melhor qualidade de vida para as atuais e futuras gerações.

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Introdução

 

A cidade se origina da necessidade de contato, comunicação, organização e troca entre homens e mulheres. Da polis decorreu a política e, com os pioneiros gregos, nasceu o estreito vinculo entre participação ativa e vida na cidade.

 mundo hoje é urbano, portanto, grande parte de seus habitantes vive em cidades — palcos de lutas em jogos incessantes de variados interesses. Ser cidadão, e morador da cidade, significa ter consciência de diretos, reivindica­-los, e cumprir, com responsabilidade, seus deveres.

A vida em cidades continua a ser um desafio no século que se inicia, pois no jogo urbano quotidiano, conflitantes interesses se apresentam. Qualquer que seja a sua escala, a cidade é uma organização viva, dinâmica, com suas diversificadas partes em permanente interação.

No Brasil, ao longo do século XX, grande número de cidades nasceram, cresceram e se desenvolveram. Foi neste século que o país mais se urbanizou.

A evolução do crescimento da população urbana, considerando-se este período, é bastante ilustrativa. É a partir da década de setenta que se inverte, com força, a relação rural-urbana até então vigente.

Hoje, o território nacional abriga 170 milhões de habitantes. Chegamos ao ano 2000 com 137.755.550 brasileiros vivendo em áreas urbanas, o que significa que 81% da população brasileira moram em cidades.

Muitas foram as conseqüências deste veloz processo. O fenômeno de urbanização provocou o agravamento do histórico quadro de exclusão social tornando mais evidente a marginalização e a violência urbanas que, atualmente são motivo de grande apreensão, tanto para moradores e usuários, quanto para os governos das cidades.

As já densas e grandes cidades se expandiram formando regiões metropolitanas, com extensas periferias ocupadas por população pobre expulsa das áreas centrais ou atraida de outros pontos do território brasileiro em busca de trabalho, renda e acesso a bens, serviços e equipamentos urbanos. Os moradores das periferias continuam desprovidos de infra-estrutura básica, a cada dia mais distantes dos centros urbanos e ainda têm que enfrentar, em seus obrigatórios deslocamentos para as áreas centrais, o insuficiente e caro sistema de transporte.

O que encontramos nas grandes cidades, contudo, podemos observar, de forma semelhante, nas médias e menores. A diferença está na proporção em que as questões, diversificadas e recorrentes, se apresentam, todas demandando complexa solução.

 Os problemas urbanos não são novos. Fazem parte do quotidiano de nossas cidades e cada vez mais se avolumam: periferias longínquas e desprovidas de serviços e equipamentos urbanos essenciais; favelas, invasões, vilas e alagados nascem e se expandem; a retenção especulativa de terrenos é constante; o adensamento e a verticalização sem precedentes pode ser verificado com freqüência; a poluição de águas, do solo e do ar assume grandes proporções; dentre outros variados e negativos aspectos.

 A distribuição dos benefícios decorrentes do processo de urbanização é historicamente injusta e resultante de décadas de descaso, de incompreensão, de preconceito, e de atuação privilegiada voltada apenas para alguns setores da cidade. O quadro urbano atual se constitui em um dos maiores desafios neste século que se inicia.

 Atuações sucessivas, porém pontuais, foram comprovadamente insuficientes para diminuir ou resolver as questões mais agudas da maioria da população brasileira, que é pobre, e se encontra vivendo precariamente em nossas cidades.

Históricas reivindicações populares quanto ao direito de todos os cidadãos à cidade — especialmente articuladas no movimento pela reforma urbana — se apresentaram com força ao longo da elaboração da Constituição Federal de 1988, assumindo destacado papel.

 Pela primeira vez, é bom frisar, a cidade foi tratada na Constituição Federal, que nasceu com o intuito de assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social.

 No estabelecimento da nova Constituição o país alcançou, também, um novo e promissor patamar com a incorporação, na lei fundamental, da participação popular nas decisões de interesse público. Este direito vem aos poucos sendo incorporado pelo poder público para levar adiante suas ações.

 A inclusão dos artigos 182 e 183, compondo o capítulo da Política Urbana foi uma vitória da ativa participação de entidades civis e de movimentos sociais em defesa do direito à cidade, à habitação, ao acesso a melhores serviços públicos e, por decorrência, a oportunidades de vida urbana digna para todos.

 Durante onze anos de tramitação legislativa, muitos foram os embates onde se explicitaram os conflitos entre inúmeros e diversificados interesses em jogo sobre o futuro destino de nossas cidades. A construção do Estatuto da Cidade foi longa e difícil, entretanto, nele estão garantidos princípios há muito desejados.

 O Estatuto da Cidade reúne importantes instrumentos urbanísticos, tributários e jurídicos que podem garantir efetividade ao Plano Diretor, responsável pelo estabelecimento da política urbana na esfera municipal e pelo pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, como preconiza o artigo 182.

 A aprovação do Estatuto da Cidade é muito recente, entretanto, os sinais são claros de que a lei veio para possibilitar a revisão de antigos comportamentos, há muito arraigados.

 Na esfera municipal, o poder público sempre teve privilegiado e destacado papel. Hoje, contudo, ele assume função de protagonista ao ser o principal responsável pela formulação, implementação e avaliação permanentes de sua política urbana, estabelecida no Plano Diretor, visando garantir, a todos, o direito à cidade e a justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização.

 Novos ares, novos instrumentos e muito trabalho pela frente se apresentam para todos os cidadãos e cidadãs brasileiras. Consensos entre os agentes responsáveis pelo desenvolvimento urbano — população, governo e empresariado — foram buscados e gradativamente se firmam.

 A sociedade, a partir da nova lei, está convocada a examinar com atenção suas práticas e, ao revê-las, consagrar renovados comportamentos e ações. Ao viver e participar ativamente do que exigiu constar em lei, aprovada por seus representantes, estará avaliando continuamente sua aplicação para reforçar suas virtudes e corrigir os possíveis defeitos da legislação ora estabelecida. O processo é permanente, em especial por se tratar de instrumentos que a lei prevê serem aplicados em cidades, organismos dinâmicos por excelência.

 O Estatuto da Cidade é, nesse momento, a esperança de mudança positiva no cenário urbano, pois reforça a atuação do poder público local com poderosos instrumentos que, se utilizados com responsabilidade, permitem ações conseqüentes para a solução ou minimização dos graves problemas observados nas cidades brasileiras.

 

A lei sozinha é claro, não resolverá os históricos problemas urbanos. Contudo, com a nova legislação, os Municípios têm a oportunidade de cumprir da melhor maneira, e ativamente, seu papel de sujeitos, responsáveis que são pela formulação, implementação e avaliação da política urbana, permitindo que, de fato, todos os moradores de nossas cidades participem do processo e sejam os beneficiários de suas justas ações.

 O presente trabalho apresenta os principais conceitos e as inovações presentes na Lei nº 10.257/2001 — Estatuto da Cidade e está organizado em cinco partes.

 Na primeira são abordadas as diretrizes gerais do Estatuto, apresentando as metas que se desejam ver atendidas e que envolvem todas as esferas do poder público — municipal, estadual e federal. Na segunda se aborda a gestão democrática nas cidades, importante conquista dos movimentos populares, hoje gravada em lei. A seguir o plano diretor é apresentado, enfatizando seu papel como instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana, as suas recentes características e as possibilidades para atuação na esfera local. Na quarta parte se encontram os instrumentos previstos para se alcançar os importantes princípios de função social da propriedade, de justa distribuição dos benefícios e dos ônus decorrentes da urbanização e a primazia do interesse público nas ações relativas à Política Urbana.

 Por fim, em anexo, se encontram, na integra, o texto do capítulo constitucional relativo à Política Urbana (artigos 182 e 183) e o Estatuto da Cidade, bem como as razões que levaram ao veto de determinados artigos propostos.

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Diretrizes gerais

 

A Lei n° 10.257 de 10 de julho de 2001 — Estatuto da Cidade — vem regulamentar os artigos 182 e 183 da Constituição Federal de 1988, que conformam o capitulo relativo à Política Urbana.

 O artigo 182 estabeleceu que a política de desenvolvimento urbano, executada pelo poder público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes, definindo que o instrumento básico desta política é o Plano Diretor.

 O artigo 183, por sua vez, fixou que todo aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirirá o seu domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. Este artigo abriu a possibilidade de regularização de extensas áreas de nossas cidades ocupadas por favelas, vilas, alagados ou invasões, bem como loteamentos clandestinos espalhados pelas periferias urbanas, transpondo estas formas de moradia para a cidade denominada formal.

 O Estatuto da Cidade ao regulamentar as exigências constitucionais reúne normas relativas a ação do poder público na regulamentação do uso da propriedade urbana em prol do interesse público, da segurança e do bem­ estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental. Além disso, fixa importantes princípios básicos que irão nortear estas ações.

 O primeiro deles é a função social da cidade e da propriedade urbana. A Constituição Federal em seu artigo 5°, incisos XXII e XXIII, dispôs que é garantido o direito de propriedade em todo território nacional, mas também estabeleceu que toda propriedade atenderá a sua vocação social.

 Alcança-se, com este importante princípio, novo patamar no campo do direito coletivo introduzindo a justiça social no uso das propriedades, em especial no uso das propriedades urbanas. E é o Estado, na sua esfera municipal, que deverá indicar a função social da propriedade e da cidade, buscando o necessário equilíbrio entre os interesses público e privado no território urbano.

 Assim, a propriedade urbana, cujo uso, gozo e disposição pode ser indesejável ao interesse público e que, o sendo, interfere diretamente na convivência e relacionamento urbanos deverá, agora, cumprir sua função social.

 Este princípio assegura que, daqui para frente, a atuação do poder público se dirigirá para o atendimento das necessidades de todos os cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas, sempre observando as exigências fundamentais de ordenação da cidade contidas no Plano Diretor.

 O Estatuto da Cidade estabelece a gestão democrática, garantindo a participação da população urbana em todas as decisões de interesse público. A participação popular está prevista e, através dela, as associações representativas dos vários segmentos da sociedade se envolvem em todas as etapas de construção do Plano Diretor — elaboração, implementação e avaliação — e na formulação, execução e acompanhamento dos demais planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano municipal. Está fixada, ainda, a promoção de audiências públicas. Nelas, o governo local e a população interessada nos processos de implantação de empreendimentos públicos ou privados, ou atividades com efeitos potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou construído, podem discutir e encontrar, conjuntamente, a melhor solução para a questão em debate, tendo em vista o conforto e a segurança de todos os cidadãos.

 Antiga reivindicação dos movimentos populares, a justa distribuição dos benefícios e dos ônus decorrentes do processo de urbanização é outro importante princípio presente no Estatuto que reafirma a obrigatoriedade do poder público de agir em prol do interesse coletivo.

 Com este principio busca-se a garantia de que todos os cidadãos tenham acesso aos serviços, aos equipamentos urbanos e a toda e qualquer melhoria realizada pelo poder público, superando a situação atual, com concentração de investimentos em determinadas áreas da cidade, enquanto sobre outras recaem apenas os ônus. Em geral, estas áreas, onde já não se realizavam investimentos, coincidem com os setores urbanos ocupados pela população pobre, que permanecem, muitas vezes, “abandonadas” pelo poder público.

 Na busca da justa distribuição de benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização, o poder público passa a atuar em sintonia com outro importante principio do Estatuto da Cidade que é a recuperação de parcela da valorização imobiliária gerada pelos investimentos públicos em infra-estrutura social e física realizados com a utilização dos impostos recolhidos — pagos por todos — que, até agora, vinham sendo apropriados, privadamente por parcela privilegiada da população.

 Aqui, mais uma vez, o Estatuto busca reverter o quadro encontrado com freqüência em nossas cidades onde o comportamento, histórico e habitual, dos proprietários de imóveis urbanos ou de empresários imobiliários causa nocivos rebatimentos no tecido urbano e oneram a administração pública. Com a aquiescência do próprio poder público, estes proprietários retêm áreas, como reserva especulativa, aguardando a crescente valorização da propriedade e se beneficiam diretamente com a implantação de infra-estrutura básica e instalação de equipamentos urbanos em seu entorno imediato. A realização pelo governo municipal de obras infra-estruturais, em geral, atende às demandas mais prementes da população ou resultam da implantação de empreendimento de porte, e de interesse de determinados grupos empresariais locais, em área próxima. Assim, estas propriedades recebem, gratuitamente, toda a infra-estrutura e os equipamentos urbanos básicos, alcançando, no mercado imobiliário, valores consideráveis.

 Outro importante princípio do Estatuto é a adequação dos instrumentos de política econômica, tributária e financeira e dos gastos públicos aos objetivos do desenvolvimento urbano, de modo a privilegiar os investimentos geradores de bem-estar geral e a fruição dos bens de diferentes segmentos sociais. Neste item se evidencia a obrigatoriedade de ajuste de todos os instrumentos de gestão financeira da administração municipal aos objetivos do desenvolvimento urbano construídos, coletivamente, pelo poder público e pelos diferentes setores sociais. Cabe lembrar que este princípio se integra aos artigos da denominada Lei de Responsabilidade Fiscal.

 O Estatuto indica, ainda, a conveniência de se evitar conflitos entre as esferas de governo na área urbanística e, ao mesmo tempo, aponta a necessária ação de Estados e Municípios na edição de suas legislações urbanísticas, complementando e implementando as disposições gerais produzidas pela União, dando assim plena concretude ao desenvolvimento urbano.

 As atribuições do poder público municipal foram expandidas após a promulgação da Constituição Federal. Nela, o Município ganha destaque na organização político-administrativa do país, sendo dotado de autonomia política, administrativa, financeira e legislativa. As possibilidades de ação do poder público municipal, com a vigência do Estatuto, se ampliam e se consolidam.

 O poder público municipal, por ser a esfera de governo mais próxima do cidadão, e portanto, da vida de todos — seja na cidade, seja na área rural — é o que tem melhor capacidade para constatar e solucionar os problemas do dia-a-dia. Essa proximidade permite, ainda, maior articulação entre os vários segmentos que compõem a sociedade local e, também, a participação e acompanhamento das associações de moradores, de organizações não­governamentais, de representantes dos interesses privados na elaboração, implementação e avaliação de políticas públicas.

 Como cabe ao Município a promoção do adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo, fica evidente a competência municipal para adotar as medidas que favoreçam o seu desenvolvimento territorial, com sustentabilidade cultural, social, política, econômica, ambiental e institucional.

 O Município, portanto, é responsável por formular a política urbana e fazer cumprir, através do Plano Diretor, as funções sociais da cidade, possibilitando acesso e garantindo o direito, a todos que nela vivem, à moradia, aos serviços e equipamentos urbanos, ao transporte público, ao saneamento básico, à saúde, à educação, à cultura e ao lazer, todos eles direitos intrínsecos aos que vivem na cidade.

 O Estatuto da Cidade estabelece, ainda, outras diretrizes gerais para que a política urbana alcance o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade.

 A primeira delas é a garantia do direito a cidades sustentáveis, ou seja, o direito de todos os habitantes de nossas cidades à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, não só para as gerações atuais, como também para as futuras.

 Sobre este tema, o Estatuto da Cidade apresenta caminhos a serem seguidos, e estabelece objetivos claros a alcançar, em sintonia com os acordos decorrentes da Conferência Mundial sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente, ECO-92, realizada na cidade do Rio de Janeiro, e com as recomendações da Agenda Habitat II resultantes da Conferência das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos, realizada na cidade de Istambul em 1996.

 A adoção de padrões de produção e consumo de bens e serviços e de expansão urbana devem ser compatíveis com os limites de sustentabilidade ambiental, social e econômica do Município e do território sob sua área de influência. O Estatuto, com esta diretriz, recomenda que a produção e o consumo de bens e de serviços respeite e vise uma sociedade mais justa (sustentabilidade social); a preservação e utilização racional e adequada dos recursos naturais, renováveis e não renováveis, incorporados às atividades produtivas (sustentabilidade ambiental); e a gestão e aplicação mais eficientes dos recursos para suprir as necessidades da sociedade e não permitir a submissão absoluta às regras de mercado (sustentabilidade econômica).

 Prevê-se, também, a proteção, a preservação e a recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico. Esta é mais uma importante medida para se obter a garantia da convivência vital entre o homem e o meio, bem como para a manutenção de nossa história urbana, seja ela local, regional ou nacional.

 De modo a evitar e, também, corrigir as distorções do crescimento urbano, e seus negativos efeitos sobre o meio ambiente, deverá ser perseguida a cooperação entre os governos federal, estadual e municipal, a iniciativa privada e os demais setores da sociedade, no processo de urbanização, em atendimento ao interesse social. Além disso, deverão ser objeto de atenção de todos os governos, o planejamento do desenvolvimento das cidades; da distribuição espacial da população; e das atividades econômicas do Município e do território sob sua área de influência.

O Estatuto se refere, também, à integração e complementariedade entre as atividades urbanas e rurais, tendo em vista o desenvolvimento econômico do Município e sua área de influência. É comum o tratamento pontual e privilegiado, com investimentos públicos, em parte da área urbana ou em arte da área rural do território municipal. O Estatuto afirma a necessidade de integração e articulação entre as áreas urbanas e rurais, especialmente em função do Plano Diretor, que deve contemplar o Município como um todo.

 Regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população pobre também estão previstas, O poder público municipal deverá se responsabilizar pelo estabelecimento de normas especiais de urbanização, de uso e ocupação do solo e de edificação, consideradas a situação sócio-econômica da população atendida e, também, fixará, para estas áreas, as normas ambientais pertinentes. Esta recomendação vem de encontro às antigas reivindicações da população moradora de favelas, invasões, vilas ou de alagados que, em alguns casos, até já foram urbanizadas e continuam sem a regularização fundiária. Casos também existem em que a população adquiriu o terreno onde se encontra a denominada favela e, mesmo assim, continua sendo percebida como ocupante “ilegal” da área. As situações são as mais diversas, contudo, esta diretriz geral para a ação do poder público municipal, apoiada nos instrumentos previstos no Estatuto da Cidade, poderá inverter o quadro de ocupações “ilegais” e promoverá a regularização urbanística em nossas cidades.

 Ainda, em atendimento às necessidades de grandes contingentes populacionais pobres, o Estatuto da Cidade indica que devem ser desenvolvidos esforços para a simplificação da legislação de parcelamento, de uso e ocupação do solo, de modo a facilitar o enquadramento das construções, realizadas pela própria população, às normas estabelecidas para as edificações, com o objetivo de possibilitar a redução de custos nos processos construtivos adotados e o aumento da oferta dos lotes e unidades habitacionais.

Finalmente, o Estatuto recomenda a isonomia de condições para os agentes públicos e privados na promoção de empreendimentos e atividades relativos ao processo de urbanização, atendido o interesse social. -

 As diretrizes gerais estabelecidas no Estatuto da Cidade buscam orientar ação de todos os agentes responsáveis pelo desenvolvimento na esfera local Indica que as cidades devem ser tratadas como um todo, rompendo a visão parcelar e setorial do planejamento urbano até agora praticado. Além disso evidencia que o planejamento deve ser entendido como processo construída a partir da participação permanente dos diferentes grupos sociais para sustentar e se adequar às demandas locais e às ações públicas correspondentes.

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Gestão democrática da cidade

 

Um dos grandes avanços na Constituição Federal foi a incorporação da participação dos cidadãos nas decisões de interesse público, após anos de luta dos movimentos populares. Há, contudo, muito ainda a caminhar neste universo de conflitos entre os diversificados interesses presentes no jogo urbano.

 O Capítulo IV do Estatuto da Cidade é dedicado à gestão democrática da cidade, onde a participação popular assume papel destacado e extrema importância. O interesse da população em participar pode encontrar lugar em todas as dimensões da política urbana, ou seja, desde a formulação do Plano Diretor, a sua negociação e aprovação na Câmara, até sua implementação e nas permanentes revisões.

 Além disso, a gestão da cidade será democrática a partir da constituição de órgãos colegiados de política urbana, debates, audiências, consultas públicas, conferências, planos e projetos de lei de iniciativa popular, referendos e plebiscitos.

 As cidades são organizações complexas onde se desenvolve, permanentemente, uma intrincada teia de relações, individuais e coletivas, que se apresentam como um jogo permanente e dinâmico de variados interesses em conflito.

 Alguns costumam ver a cidade dividida em duas: a formal e a informal. Na primeira, moram, trabalham, circulam e se divertem os privilegiados grupos que têm acesso aos sofisticados investimentos públicos. A outra, denominada informal, está ocupada por população pobre que também trabalha, circula e se diverte na cidade, porém, mora em favelas, em loteamentos irregulares e loteamentos ilegais que cresceram e se expandiram sem a ação efetiva do poder público na dotação necessária dos serviços e equipamentos urbanos básicos.

Entre estes dois extremos — antagônicos, concorrentes e complementares —se desenvolve a vida urbana brasileira. Em maior ou menor grau esta situação é encontrada em nossas cidades, das bem pequenas às metrópoles.

 Problemas como a pouca ou precária disponibilidade de áreas, elevado preço da terra, crescimento e expansão urbana em reduzido período de tempo, a densa ocupação de favelas e loteamentos irregulares e clandestinos sem infra-estrutura básica e equipamentos essenciais retratam o uso desigual e injusto do solo em nossas cidades e são fatores-chave para a luta desenvolvida em prol da gestão urbana democrática.

 O Estatuto da Cidade, ao prever um capítulo dedicado à gestão democrática, evidencia que sem a compreensão mais profunda dos processos e conflitos em jogo na questão urbana, dificilmente se atenderá aos princípios constitucionais de direito de todos à cidade, da função social da propriedade e da justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização.

 O Estatuto apresenta a possibilidade concreta do poder público local agir, através da política urbana, sobre os processos em curso, mediando os conflitos decorrentes da vida na cidade. O município, como importante agente do desenvolvimento que é, deve atuar em função do interesse publico reunindo as demandas e orientando as ações dos demais agentes população e empresariado.

 As disputas presentes nas relações de poder impuseram a democratização das ações públicas, especialmente na esfera municipal, voltadas para os interesses e direitos de todos, incorporando uma nova dimensão à gestão.

Hoje, a população detém o direito de intervir diretamente na organização de seu espaço de vida, em sua cidade. Este é um dos fundamentais aspectos da luta histórica da população que buscou a integração entre gestão da cidade e democracia. Os instrumentos previstos dão passagem a uma nova cultura política, embasada na complementariedade entre democracia participativa e representativa.

 Assim, hoje todos têm direito à informação nos órgãos públicos. Projetos de lei podem partir de iniciativa popular e está garantido o veto da população a propostas contrárias ao seu interesse. As associações de moradores podem representar em juízo a vontade de seus membros. Estão previstos espaços para a participação popular através de audiências públicas, conselhos municipais, plebiscito e referendo. Planos urbanísticos deverão, necessariamente, ser aprovados no âmbito do poder legislativo e, ainda, se prevê a manifestação de entidades representativas durante as sessões nas Câmaras de Vereadores e Assembléias Legislativas.

 A lei impõe normas, aponta diretrizes e oferece dispositivos para sua implementação, porém não está garantida sua justa e adequada aplicação. Há interesses opostos à democratização da cidade. O caminho para sua efetivação está sendo aberto pelo Estatuto da Cidade. Cabe ao poder público municipal tirar o melhor proveito dos instrumentos ora apresentados aliando­-se aos demais interessados nesta democratização da gestão.

 A responsabilidade não é só do poder público, a democracia pressupõe direitos e deveres, portanto, uma gestão democrática será aquela que apresentar a co-participação de todos os agentes e atores responsáveis pelo desenvolvimento envolvidos diretamente nas variadas e permanentes questões apresentadas no quotidiano da cidade.

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Plano diretor

 

A Constituição Federal determina que o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana é o Plano Diretor.

 O planejamento na esfera local ressurge, com vigor, nos anos noventa. Para além da exigência constitucional, o intenso crescimento das cidades brasileiras reforça o papel do planejamento local como importante instrumento para organização das ações governamentais, visando o bem-estar coletivo e a justiça social.

 A visão atual do Plano Diretor difere bastante de sua concepção anterior. De mero documento administrativo com pretensão de resolução de todos os problemas locais, desconsiderando as práticas sociais quotidianas, o Plano Diretor assume a função de, como instrumento, interferir no processo de desenvolvimento local, a partir da compreensão integradora dos fatores políticos, econômicos, financeiros, culturais, ambientais, institucionais, sociais e territoriais que condicionam a situação encontrada no Município.

O Plano Diretor, deixa de ser o plano de alguns para ser de todos, construído a partir da participação dos diferentes setores sociais, fazendo com que, coletivamente, ocorra a sua elaboração, implementação e sua natural e necessária revisão. As estratégias, originalmente adotadas, podem ser revistas após a avaliação responsável e conseqüente do Plano Diretor, permitindo mudanças nos rumos anteriormente traçados e perseguidos.

 De acordo com o Estatuto da Cidade, o Plano Diretor deve ser aprovado por lei municipal e se constitui em instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana. Como parte de todo o processo de planejamento municipal, o Plano Diretor deverá estar integrado ao plano plurianual, às diretrizes orçamentárias e ao orçamento anual.

É importante considerar a vinculação do Plano Diretor ao processo de planejamento por ventura existente. Muitas vezes, o Plano Diretor pode ser a alavanca para a institucionalização de processo permanente de planejamento.

Por isso, ele não é imutável, pode e deve ser continuamente revisto, de modo a se adequar às mudanças que venham a ocorrer na realidade local.

O caráter dinâmico de nossas cidades e a sua complexidade intrínseca, considerando quaisquer de suas diferentes escalas, pressupõem a existência de um processo de planejamento do desenvolvimento urbano, também dinâmico e pleno de complexidade.

 Algumas indicações de caráter geral podem auxiliar na percepção dos rumos que o planejamento na esfera local deve assumir.

O Plano Diretor transcende uma gestão administrativa pelos objetivos gerais e integrados que persegue. Sendo assim, ao estabelecer diretrizes de mais largo prazo, devem ser garantidas a necessária coerência e a continuidade nas ações, em especial daquelas que se referem a base econômica do Município, as voltadas para a localização de atividades no território municipal, as relativas à expansão da área urbana e à proteção do ambiente natural, dentre outras importantes metas que não podem estar submetidas a mudanças conjunturais e se limitarem a um único período de quatro anos de governo.

 Importante aspecto dos atuais planos diretores é que eles necessariamente consideram a participação da população, seja na sua elaboração, no seu acompanhamento, seja em sua revisão. A participação da população pode ocorrer de distintas maneiras, como, por exemplo, nos processos de discussão das potencialidades e identificação dos problemas existentes na escala local, através de conselhos, comitês ou comissões de representantes de variados segmentos da população, do empresariado e das diferentes esferas de governo.

 No Estatuto da Cidade se encontra a garantia de que os poderes legislativo e executivo promoverão audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos que compõem a sociedade local. Além disso, todos os documentos e informações produzidos devem se tornar públicos, sendo livre o acesso de qualquer interessado aos documentos e informações produzidos.

 Isto significa entender e construir o Plano Diretor na esfera local com a clara compreensão de que ele é um importante documento de governo, portanto, a principal referência para a ação governamental e, ao ser legitimado por todos, estabelece-se, entre os diferentes agentes do desenvolvimento, um pacto. Dessa forma, suas orientações são, ao mesmo tempo, resultado de uma construção pactuada coletivamente e base para o controle social sobre a ação do poder público no território municipal.

 Sabemos que não podemos mais isolar de modo mutilador as diversificadas dimensões do fenômeno urbano. Ele só será melhor compreendido através da incorporação de múltiplas visões e integração de suas inúmeras dimensões. Sabemos, também, que a “realidade” urbana é, ao mesmo tempo, solidária e conflituosa, como também o é a democracia — sistema que se alimenta de antagonismos e concomitantemente os regula. Estas são visões a serem incorporadas, cada vez mais, no quotidiano de nossas cidades e municípios e, claro, de nossas ações como cidadãos.

 Muitos municípios já elaboraram o Plano Diretor para todo o território municipal; outros o limitaram às cidades-sede; outros há que desenvolveram seu Plano Diretor considerando também as cidades dos seus respectivos distritos. Várias abrangências podem ser identificadas. Contudo, muitos municípios, apesar da obrigatoriedade constitucional de elaboração de Plano Diretor nas cidades com mais de vinte mil habitantes, em vigor desde 1968, ainda não o elaboraram. O Estatuto da Cidade estabelece que o Plano Diretor deverá considerar todo o território municipal.

 O Brasil possui, hoje, 5.561 municípios. Deste total, 4.172 possuem cidades com até vinte mil habitantes. Os demais, 1.389 municípios, abrigam cidades com mais de vinte mil habitantes. Portanto, todos estes estão obrigados a elaborar seu Plano Diretor.

 Como já mencionado, muitos já o fizeram, mas deverão adequá-los às exigências legais atualmente vigentes, considerando as práticas sociais quotidianas e a participação permanente da população no processo de planejamento.

 

BRASIL: MUNICÍPIOS POR FAIXAS DE POPULAÇÃO

 

Habitantes(por mil)

até 20

20 a 50

50 a 100

100a500

BRASIL

4.172

908

279

175

Norte

302

103

30

12

Nordeste

1.255

395

96

37

Sudeste

1.185

267

106

99

Sul

1.055

84

30

18

Centro-oeste

375

59

17

9

Fonte:    Instituto Brasileiro de Administração Municipal, 2001

 

É importante assinalar que é obrigatório, pelo Estatuto da Cidade, que as cidades integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, as pertencentes a áreas de especial interesse turístico e, ainda, as inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto de âmbito regional ou nacional elaborem seus respectivos planos diretores, mesmo que tenham menos de vinte mil habitantes.

Se encontra estabelecido no Estatuto que nas grandes e médias cidades, ou seja, naquelas com mais de quinhentos mil habitantes, é obrigatória, ainda, a elaboração de plano de transporte urbano integrado, compatível com o Plano Diretor, ou dele fazendo parte.

 Está previsto, também, que a lei que instituir o Plano Diretor deverá ser revista, pelo menos, a cada dez anos. Esta exigência indica o caráter dinâmico das cidades e dos municípios. Tem sido freqüente que, após a elaboração do Plano Diretor e de sua implementação no todo ou em parte, o poder público local se sinta desobrigado a rever, reanalisar e a adequar sua implementação. Entretanto, a idéia de manter um processo permanente de planejamento deve estar inserida no quotidiano do município e da cidade, portanto, no dia-a-dia dos cidadãos.

 Mais uma novidade que o Estatuto da Cidade apresenta é a obrigatoriedade de determinados conteúdos mínimos nos planos diretores que serão elaborados. O primeiro deles é a delimitação das áreas urbanas onde se poderá aplicar o parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, e, em seqüência, o imposto predial e territorial urbano progressivo no tempo e a desapropriação. Também será necessário o atendimento do que se encontra previsto, na própria lei, com relação ao direito de preempção (de preferência), direito de construir, operações consorciadas e transferência do direito de construir.

Para que a propriedade urbana cumpra a sua função social, ela deve responder às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no Plano Diretor. Tais exigências dizem respeito à busca de melhor adequação do uso da propriedade e à responsável utilização dos recursos naturais, garantindo a preservação do ambiente urbano.

Sendo assim, o Plano Diretor deve definir os usos adequados da propriedade urbana, os padrões mínimos e máximos de utilização que caracterizam este uso, definir os locais e as finalidades para os quais é autorizada a transferência ou a cessão onerosa do direito de construir, identificar a parcela da área urbana onde os imóveis não edificados, subutilizados ou não utilizados poderão ser objeto de parcelamento e edificação compulsórios.

O Estatuto, em suas disposições gerais, fixa que os municípios com mais de vinte mil habitantes em suas cidades ou que pertençam a regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, se não tiverem Plano Diretor aprovado até a entrada em vigor da lei, deverão aprová-los no prazo de cinco anos.

O poder público municipal se encontra, a partir da vigência do Estatuto da Cidade, com poderosas ferramentas na mão para enfrentar os já históricos desafios do desenvolvimento urbano, todas elas se vinculam ao instrumento básico da política urbana que é o Plano Diretor.

Os municípios deverão, ainda, estabelecer uma gestão participativa, gerar informações sobre o território municipal e o seu uso, atualizar seus cadastros, aperfeiçoar seu sistema tributário e conhecer a dinâmica do mercado imobiliário.

Com os Planos Diretores elaborados em novas e responsáveis bases, prevendo a aplicação dos instrumentos presentes no Estatuto da Cidade, podemos imaginar que, gradativamente, se estará construindo uma política nacional para o desenvolvimento urbano.

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Instrumentos previstos

 

Os instrumentos previstos no Estatuto da Cidade guardam semelhança com alguns adotados e experimentados, internacionalmente, para controle do uso do solo urbano. A maioria deles é conhecida no país, sua utilização, contudo tem sido restrita.

Vários motivos explicam sua não adoção. Dentre eles se encontram impedimentos culturais, históricos, jurídicos, ou mesmo, e principalmente, os impedimentos decorrentes dos interesses políticos em jogo.

Entretanto, a situação da maioria de nossas cidades requer que se lance mão de todos os recursos existentes e que se criem instrumentos capazes deste enfrentamento político. Como cada cidade é um caso particular e único, justificam-se as atuações experimentais com as composições e adaptações necessárias e adequadas a cada um dos lugares.

O Estatuto da Cidade dedica grande parte de seu conteúdo aos instrumentos para a promoção da política urbana, em especial na esfera municipal, classificados, de acordo com sua natureza, em tributários, financeiros ou econômicos; jurídicos; administrativos e políticos.

Se encontram estabelecidos, também como instrumentos da política urbana, os planos nacionais, regionais e estaduais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social; o planejamento das regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões; e o planejamento municipal.

A lei irá regulamentar, dos instrumentos previstos, os já mencionados nos artigos 182 e 183 da Constituição Federal, quais sejam: parcelamento, edificação ou utilização compulsórios; imposto predial e territorial urbano progressivo no tempo; desapropriação com pagamento em títulos da dívida; e usucapião especial de imóvel urbano.

Contudo, a lei resgata, ainda, outros valiosos instrumentos como o direito de superfície; o direito de preempção (de preferência); a outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso; as operações urbanas consorciadas; a transferência do direito de construir; e o estudo de impacto de vizinhança.

Os demais institutos mencionados no Estatuto da Cidade e que possuem legislação própria, se encontram sucintamente descritos no final do presente capitulo.

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Parcelamento, edificação ou utilização compulsórios

Imposto predial e territorial urbano progressivo no tempo

Desapropriação com pagamento em títulos da dívida pública.

 

Em diversas cidades brasileiras, há uma quantidade expressiva e inaceitável de terrenos ociosos no tecido urbano, estocados em geral com fins especulativos. O proprietário aguarda a valorização do lugar, a partir da intervenção, exclusiva e privilegiada, do poder público com a instalação de infra-estrutura básica e implantação de equipamentos urbanos essenciais. Além de interferirem negativamente no mercado de terras, estas áreas oneram o poder público municipal, pois, muitas vezes, o município se vê obrigado a atender às justas reivindicações dos moradores de áreas desprovidas de toda e qualquer infra-estrutura e, nesta tarefa, dota de serviços e equipamentos também os terrenos ociosos existentes no caminho.

A retenção especulativa de imóvel urbano ocorre quando o respectivo proprietário não investe em seu terreno e também não o vende, esperando que seu valor de mercado aumente ao longo do tempo, em virtude dos investimentos feitos na vizinhança pelo poder público e, também, por agentes privados.

O prejuízo que a ociosidade de imóveis pode causar à população de uma cidade é o alto custo, por habitante, de equipamentos e serviços públicos. Isso acontece quando muitos terrenos permanecem baldios no interior de bairros já consolidados e quando, ao redor da cidade, se multiplicam loteamentos e conjuntos residenciais, dispersos, em área ainda não urbanizada e distantes dos locais onde há oferta de empregos, comércio e serviços urbanos.

O artigo 182 da Constituição Federal, em seu parágrafo quarto, diz que é facultado ao poder público municipal, mediante lei especifica para área incluída no Plano Diretor, exigir nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: parcelamento, edificação ou utilização compulsórios; imposto predial e territorial urbano progressivo no tempo; e a desapropriação com pagamento em títulos da dívida pública.

O principal objetivo destes três instrumentos, de aplicação sucessiva, é o combate à retenção de terrenos ociosos em setores da cidade que, cada vez mais, se valorizam ao serem dotados, pelo poder público municipal, de infra-estrutura e serviços urbanos, aumentando os custos de urbanização e expandindo, desnecessariamente, as áreas urbanas.

 

Parcelamento, edificação ou utilização compulsórios.

 

O Estatuto da Cidade determina a criação de rei municipal especifica para reger o parcelamento, a edificação ou a utilização compulsórios do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado. Esta lei deverá fixar as condições e os prazos para implementação da referida obrigação, aplicando-se em área incluída no Plano Diretor.

É considerado subutilizado o imóvel cujo aproveitamento seja inferior ao mínimo definido no Plano Diretor ou em legislação dele decorrente. O critério da subutilização aplica-se tanto a glebas passíveis de parcelamento — possibilitando ampliar o acesso à terra urbana para fins de moradia—, quanto à ocupação de lotes com construções para diferentes usos.

 

Com a aplicação deste primeiro instrumento, procura-se otimizar os investimentos públicos realizados e penalizar o uso inadequado, fazendo com que a propriedade urbana cumpra a sua função social. Além disso, poderá ser ampliada a oferta de imóveis no mercado imobiliário e promovido o uso e a ocupação de imóveis em situação de abandono, especialmente aqueles localizados na área central das grandes cidades, que poderão abrigar, por exemplo, o uso habitacional como forma de revitalização do centro urbano.

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Imposto predial e territorial urbano progressivo no tempo

 

A idéia central desse instituto é punir com um tributo de valor crescente, ano a ano, os proprietários de terrenos cuja ociosidade ou mal aproveitamento acarrete prejuízo à população. Aplica-se aos proprietários que não atenderam à notificação para parcelamento, edificação ou utilização compulsórios.

O objetivo é estimular a utilização socialmente justa e adequada desses imóveis ou sua venda. Neste caso, os novos proprietários se responsabilizarão pela adequação pretendida.

O IPTU progressivo no tempo está na seqüência das sanções previstas pelo art. 182 da Constituição Federal, que se vincula ao não cumprimento do parcelamento, edificação ou utilização de compulsórios.

A aplicação do imposto predial e territorial progressivo no tempo ocorrerá, segundo o Estatuto, mediante elevação da alíquota pelo prazo de cinco anos consecutivos, tendo como limite máximo 15% do valor venal do imóvel.

Parece que as melhores perspectivas de efetividade do IPTU progressivo no tempo ocorrerão em municípios que possuam um adequado sistema de cobrança.

Faz-se necessário, também, a permanente organização e atualização do cadastro imobiliário.

O imposto progressivo no tempo, para ser aplicado com justiça e eficácia, implica em um preparo cuidadoso, por parte do poder público municipal. Ao considerar sua adoção num determinado município, cabe, inicialmente, avaliar se a cidade tem de fato problemas decorrentes da ocupação excessivamente dispersa, e se o governo municipal está preparado para adotar um instrumento novo e relativamente sofisticado de gestão.

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Desapropriação com pagamento em títulos da dívida pública

 

Decorridos cinco anos de cobrança do IPTU progressivo no tempo, sem que o proprietário tenha cumprido a obrigação de parcelamento, edificação ou utilização, o poder público municipal poderá proceder à desapropriação do imóvel, com pagamento em títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.

As áreas que chegarem a ser objeto de desapropriação, nesta seqüência de procedimentos, poderão servir para promoção de transformações na cidade, dentre elas, por exemplo, a implantação de unidades habitacionais ou a criação de espaços públicos para atividades culturais, de lazer e de preservação do meio ambiente; bem como a destinação de áreas para atividades econômicas voltadas à geração de renda e emprego para população pobre.

Sua utilização somente se dará no caso de ineficácia das penalidades anteriormente citadas, quando, então, o poder público municipal poderá dar ao terreno ocioso a destinação socialmente mais adequada.

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Usucapião especial de imóvel urbano

 

O Estatuto da Cidade trata da usucapião especial de imóvel urbano, regulamentando o artigo 183 da Constituição Federal, que estabelece a aquisição de domínio para aquele que possuir área ou edificação urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, com a ressalva de que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. Onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, poderá ocorrer a usucapião coletiva, desde que os possuidores também não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural.

Acerca da usucapião constitucional (art. 183), cumpre notar que o instituto não tem as mesmas características daqueles regulados pelo Código Civil. A Carta Magna introduz o instituto da usucapião pró-moradia em áreas urbanas, acrescido, pelo Estatuto da Cidade, da figura da usucapião coletiva, cuja previsão é importante para a regularização fundiária de favelas, loteamentos clandestinos e cortiços.

A usucapião é instituto jurídico antigo, aplicado na área rural, e criado com fundamento na função social da propriedade, embora este principio ainda não fizesse parte da Constituição Federal.

A usucapião trata da posse efetiva do bem, transformando-a em domínio, propriedade ou em outro direito real, após o mero decurso do prazo previsto em lei. Portanto, não é de hoje que a lei brasileira reconhece direitos ao possuidor perante o proprietário que não utiliza efetivamente sua propriedade. Esse direito será conferido ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.

 

Efetivamente, a usucapião coletiva está voltada para a promoção da justiça e para a redução das desigualdades sociais. A histórica negação da propriedade para grandes contingentes populacionais residentes em favelas, invasões, vilas e alagados, bem como em loteamentos clandestinos ou em cortiços pode ser corrigido por este instrumento, cuja meta é o atendimento das funções sociais da cidade e da propriedade, possibilitando a melhoria das condições habitacionais dessas populações, tanto em áreas urbanas já consolidadas, como em áreas de expansão.

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Direito de superfície

 

O direito de superfície possibilita que o proprietário de terreno urbano conceda, a outro particular, o direito de utilizar o solo, o subsolo ou o espaço aéreo de seu terreno, em termos estabelecidos em contrato — por tempo determinado ou indeterminado — e mediante escritura pública firmada em cartório de registro de imóveis.

O direito de superfície surge de convenção entre particulares. O proprietário de imóvel urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado poderá atender às exigências de edificação compulsória estabelecida pelo poder público, firmando contrato com pessoa interessada em ter o domínio útil daquele terreno, mantendo, contudo, o terreno como sua propriedade. Os interesses de ambos são fixados mediante contrato, onde as partes estabelecem obrigações e deveres entre si.

O direito de superfície dissocia o direito de propriedade do solo urbano do direito de utilizá-lo, com a finalidade de lhe dar destinação compatível com as exigências urbanísticas.

Quem se responsabilizar por tal tarefa adquire o direito de uso das edificações e das benfeitorias realizadas sobre o terreno. Isto quer dizer que se transfere para quem se beneficia do direito de superfície a prerrogativa de uso daquele espaço. Findo o contrato, as benfeitorias realizadas no terreno serão revertidas para o Proprietário do terreno, sem indenização. Deve-se observar que o contrato pode estabelecer se o proprietário está ou não obrigado a indenizar quem usou o direito de superfície em seu terreno.

A concessão do direito de superfície poderá ser gratuita ou onerosa e quem usufrui da superfície de um terreno responderá, integralmente, pelos encargos e tributos que na propriedade incidirem, arcando, ainda, proporcionalmente à sua parcela de ocupação efetiva, com os encargos e tributos sobre a área objeto da concessão, salvo disposição contrária estabelecida em contrato. Tal direito se extingue, caso haja desvio da finalidade contratada.

A previsão de adoção, pelo Estatuto da Cidade, do direito de superfície visa, fundamentalmente, estimular a utilização de terrenos urbanos mantidos ociosos. Este direito permite oferecer ao proprietário de solo urbano uma vantajosa alternativa para cumprimento da exigência de edificação e utilização compulsórios, sem que se cumpra a seqüência sucessória prevista, e onde os benefícios da adoção deste instrumento serão rebatidos na cidade como um todo.

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Direito de preempção

 

O direito de preempção é instrumento que confere, ao poder público municipal, preferência para a compra de imóvel urbano, respeitado seu valor no mercado imobiliário, e antes que o imóvel de interesse do município seja comercializado entre particulares.

Para usufruir deste direito, o Município deverá possuir lei municipal, baseada no Plano Diretor, que delimite as áreas onde incidirá a preempção. A lei que fixa as áreas objeto de incidência deste direito não poderá vigorar por mais de cinco anos, porém, pode ser renovada após um ano de seu término. Ao instituir o direito de preferência, a lei municipal deve enquadrar cada área em uma ou mais finalidades relacionadas no Estatuto.

O instrumento permite, ainda, que o poder público tenha preferência na aquisição de imóveis de interesse histórico, cultural ou ambiental, para que estes recebam usos especiais e de interesse coletivo. Permite, também, a aquisição de áreas para a construção de habitações populares, atendendo a uma demanda social, bem como para a implantação de atividades destinadas ao lazer e recreação coletivos, como, por exemplo, parques, ou mesmo para a realização de obras públicas de interesse geral da cidade.

O uso, pelo poder público municipal, deste instrumento permite, também, que o Município, se o desejar, e a partir de cuidadoso planejamento, constitua gradativamente uma reserva fundiária ou estoque de terrenos, sem a necessidade de adoção de medidas drásticas como a desapropriação, que muitas vezes acarretam problemas sociais e jurídicos.

 importante destacar os limites existentes para a adoção do direito de preempção (ou de preferência). Um deles diz respeito à disponibilidade de recursos públicos para a aquisição preferencial de imóveis. Além disso, faz-se necessário que o poder público possua um sistema de planejamento que permita enquadrar as áreas em finalidades especificas e programadas. Para sua adoção, em bases sólidas, é fundamental o conhecimento e o acompanhamento da dinâmica do mercado imobiliário.

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Outorga onerosa do direito de construir

 

A outorga onerosa do direito de construir consiste na possibilidade de o Município estabelecer relação entre a área edificável e a área do terreno, a partir da qual a autorização para construir passaria a ser concedida de forma onerosa. Por exemplo: a relação 1 possibilita construir 1 vez a área do terreno, a relação 2, permite construir 2 vezes a área do terreno, e assim por diante. Sendo assim, o proprietário poderá construir para além da relação estabelecida, porém, pagando ao poder público este direito concedido, com valor proporcional ao custo do terreno.

O Plano Diretor deverá fixar áreas nas quais o direito de construir e de alteração de uso poderá ser exercido, estabelecendo relação possível entre a área edificável e a do terreno. Poderá, também, fixar um coeficiente de aproveitamento básico, único para toda a zona urbana, ou nos casos necessários, adotar coeficiente diferenciado para áreas especificas.

O Plano Diretor definirá, ainda, os limites máximos de construção a serem atingidos, considerando a infra-estrutura existente e o potencial de densidade a ser alcançado em cada área.

As condições a serem observadas para a outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso deverão constar em lei municipal especifica, onde serão estabelecidos: a fórmula de cálculo para a cobrança; os casos passíveis de isenção do pagamento da outorga; e a contrapartida do beneficiário.

Os recursos provenientes da adoção da outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso deverão ser aplicados na construção de unidades habitacionais, regularização e reserva fundiárias, implantação de equipamentos comunitários, criação e proteção de áreas verdes ou de interesse histórico, cultural ou paisagístico.

A utilização deste instrumento possibilita um maior controle das densidades urbanas; permite a geração de recursos para investimentos em áreas pobres; e promove a desaceleração da especulação imobiliária. Cabe registrar, contudo, que a sua adoção exige, do poder público, controles muito ágeis e complexos.

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Transferência do direito de construir

 

Este instrumento compreende a faculdade conferida, por lei municipal, ao proprietário de imóvel, de exercer em outro local o direito de construir previsto nas normas urbanística  e ainda não exercido.

Trata-se de um instrumento que já está sendo usado por alguns municípios, trazendo flexibilidade na aplicação da legislação urbanística e na gestão urbana, tendo inúmeras aplicações, como, por exemplo, a preservação de imóveis de interesse histórico, proteção ambiental ou operações urbanas.

O direito de transferência previsto no Plano Diretor, ou em legislação urbanística dele decorrente, só poderá ser aplicado quando o referido imóvel for considerado necessário para fins de: a) implantação de equipamentos urbanos e comunitários; b) preservação, quando o imóvel for considerado de interesse histórico, ambiental, paisagístico, social ou cultural; e c) servir a programas de regularização fundiária, urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda e habitação de interesse social.

No Brasil, a origem desse instrumento está vinculada à proteção do ambiente natural e do construído (patrimônio arquitetônico), objetivando o incentivo a sua preservação. Sendo parte de uma política de incentivo à preservação, tal instrumento deve ter sua adoção inserida em um planejamento cuidadoso, com objetivos e metas bem definidos, e custos avaliados em função do interesse público.

Cabe lembrar que, nos procedimentos da transferência, o poder público deve considerar a possibilidade da vizinhança absorver o impacto urbanístico decorrente e o possível aumento de densidade provocado pelos índices transferidos. Outra exigência se refere à concordância dos proprietários para efetiva negociação e à própria capacidade do poder público para gerenciar o processo.

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Operações urbanas consorciadas

 

As operações urbanas consorciadas referem-se a um conjunto de intervenções e medidas, coordenadas pelo poder público municipal, com a finalidade de preservação, recuperação ou transformação de áreas urbanas contando com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados. O objetivo é alcançar, em determinada área, transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental.

A lei especifica de aprovação do instrumento deverá conter o plano de operação urbana consorciada, definindo a área a ser atingida, com programa básico de sua ocupação; a previsão de um programa de atendimento econômico e social para a população diretamente afetada pela operação; as finalidades da operação; um estudo prévio de impacto de vizinhança; a contrapartida a ser exigida dos proprietários, usuários permanentes e investidores privados em função da utilização dos benefícios previstos na lei; e a forma de controle da operação, obrigatoriamente compartilhada com representação da sociedade civil.

A operação urbana possibilita ao município uma maior amplitude para tratar de diversificadas questões urbanas, e permite que delas resultem recursos para o financiamento do desenvolvimento urbano, em especial quando as operações urbanas envolvem empreendimentos complexos e de grande porte. Dessa forma, o poder público poderá contar com recursos para dotar de serviços e de equipamentos as áreas urbanas desfavorecidas.

Para viabilizar uma operação urbana, há a possibilidade de serem previstas a modificação de índices e de características do parcelamento, uso e ocupação do solo e subsolo; as alterações das normas para edificação; a regularização de construções, reformas ou ampliações executadas em desacordo com a legislação vigente; e a emissão, pelo município, de certificados de potencial adicional de construção, a serem alienados em leilão.

Os condicionantes impostos para aplicação deste instrumento referem-se à dinâmica do mercado imobiliário, à existência de interesse dos agentes envolvidos na participação e à capacidade do poder público em estabelecer parcerias e mediar negociações, bem como firmar sua competência para gerir a aplicação da operação urbana consorciada.

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Estudo de impacto de vizinhança

 

O Estatuto da Cidade estabelece que lei municipal definirá os empreendimentos e atividades privadas ou públicas em área urbana, que dependerão de elaboração de estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV) para obter as licenças ou autorizações de construção, ampliação ou funcionamento, a cargo do poder público municipal.

 O EIV será executado de forma a contemplar a análise dos efeitos positivos e negativos do empreendimento ou atividade na qualidade de vida da população residente na área e em suas proximidades.

O estudo de impacto de vizinhança incluirá, ao analisar os impactos do novo empreendimento, pelo menos: o aumento da população na vizinhança; a capacidade e existência dos equipamentos urbanos e comunitários; o uso e a ocupação do solo no entorno do empreendimento previsto; o tráfego que vai ser gerado e a demanda por transporte público; as condições de ventilação e de iluminação; bem como as conseqüências, para a paisagem, da inserção deste novo empreendimento no tecido urbano e, também suas implicações no patrimônio cultural e natural.

O EIV, além de contemplar as questões acima citadas, deverá considerar a opinião da população diretamente afetada pelo empreendimento e a abrangência destes impactos, que podem vir a se estender para área além dos limites da própria cidade.

Registra-se que o Estudo de Impacto de Vizinhança não substitui a elaboração e a aprovação de Estudo Prévio de Impacto Ambiental — EIA, requerido nos termos da legislação ambiental.

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Síntese jurídica dos demais instrumentos mencionados no Estatuto da Cidade.

 

Contribuição de melhoria

 

A contribuição de melhoria é uma das espécies tributárias, ao lado dos impostos e taxas. Encontra-se prevista no artigo 81 do Código Tributário Nacional. É instituída de modo a recuperar para os cofres públicos, ao menos parcialmente, os recursos aplicados em obras públicas que tenham gerado valorização imobiliária. Sua incidência ocorre em função de cada imóvel beneficiado, na medida do acréscimo do seu valor venal.

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Incentivos e benefícios fiscais e financeiros

 

Sobre a questão, convém lembrar a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n° 101/00), a condicionar tanto a renúncia de receita quanto o aumento de despesa. Mencione-se aqui também o art. 150, § 6° da Constituição Federal, a estipular outras condições para o tratamento tributário, mais benéfico ao contribuinte.

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Desapropriação

 

É o procedimento através do qual o Poder Público ou seus delegados impõe a perda do direito à propriedade sobre determinado bem, que passa ao patrimônio da entidade expropriante. Justificam a desapropriação por utilidade ou necessidade pública, os casos previstos no Decreto-lei n° 3.365/41, o qual regulamenta também o respectivo procedimento, tanto na via administrativa quanto na via judicial. Para os casos de interesse social, aplicam-se, conforme a hipótese, as Leis Federais n° 4.132/62, 8.629/93 (para fins de reforma agrária) e o próprio Estatuto da Cidade, em seu artigo 8° convém destacar não ser apenas esta última hipótese de desapropriação a única apta a promover o desenvolvimento urbano.

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Servidão administrativa

 

É ônus instituído pelo Poder Público sobre imóvel de propriedade alheia — normalmente sobre parte dele—, para assegurar a realização de serviço público ou preservar bem afetado à utilidade pública. Não há propriamente uma lei geral sobre essa forma de intervenção na propriedade, sendo o instituto mencionado de passagem no artigo 40 do Decreto-lei rn 3.365/41. Destaca-se a necessidade de indenização, sempre que o sacrifício no direito à propriedade trouxer prejuízos especiais a seu titular. As faixas de recuo estabelecidas às margens de rodovias e a instalação de aquedutos em terrenos particulares para aproveitamento de águas no interesse público são exemplos de servidão administrativa.

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Limitações administrativas

 

Compreendem o conjunto de restrições impostas à propriedade de modo a definir a extensão das prerrogativas que possui o proprietário. Conformam as possibilidades de usar, gozar e dispor que, do ponto de vista jurídico, somente existem nos termos amparados por lei. Os índices urbanísticos (coeficiente de aproveitamento e taxa de ocupação do solo etc.) são espécies de limitações. Do ponto de vista mais prático, destacam-se das servidões porque atendem a interesses difusos, como a saúde pública, adensamento populacional, paisagismo etc., sem ensejar o aproveitamento direto do imóvel em favor de serviço ou bem público. Por serem genéricas e definidoras do próprio direito à propriedade, que não é absoluto, pois há de cumprir sua função social, entende ­se que as limitações não geram direito à indenização.

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Tombamento

 

É restrição ao direito à propriedade que tem por objetivo proteger o patrimônio cultural. O proprietário submete-se aqui a sacrifício parcial de seu direito definido pelas limitações administrativas. A inscrição do bem no Livro de Tombo - dai o nome tombamento - será fruto de procedimento administrativo, buscando preservar aquelas características físicas do bem que estão associadas à história, às artes, ou a qualquer outro aspecto relacionado à cultura da sociedade. A titulo de normas gerais aplicam-se as dispostas no Decreto-lei federal n° 25/37. Neste mesmo Diploma Legal são tratadas questões especificas ao procedimento administrativo promovido pela União. Estados, Municípios e o Distrito Federal devem ter suas regras próprias, observando as regras gerais mencionadas.

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Unidades de conservação

 

Os espaços territoriais que apresentem significativa importância ou representatividade para o meio ambiente natural devem ser objeto de especial proteção, dispõe o artigo 225, § 1°, III da Carta Constitucional. Para tanto a Lei Federal n° 9.985/00 estabelece uma série de unidades de conservação (parques, estações ecológicas, áreas de proteção ambiental etc.), cada qual adequada para um tipo de situação. Todos os entes federativos são competentes para estabelecer tais unidades em seus respectivos territórios, observando a disciplina contida na legislação federal e eventualmente as suas respectivas normas.

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Zonas especiais de interessa social

 

Quando a legislação de Direito Público se refere à expressão “interesse social”, normalmente reporta-se ao atendimento das necessidades das camadas mais pobres da população ou, em outras palavras, à redução das desigualdades econômicas e sociais. Se no zoneamento — em sentido amplo — se faz a divisão do território em várias zonas para serem definidas as formas de uso e de ocupação de cada um desses espaços, a fim de conferir-lhes maior homogeneidade, a zona especial de interesse social será aquela mais comprometida com a viabilização dos interesses das camadas populares. A legislação urbanística recomenda-se adotar, pelo menos em algumas áreas, padrões compatíveis com a realidade das pessoas de baixa renda, para não lançá-las na ilegalidade. Muitas vezes a observância dos padrões urbanísticos idealizados é inviável na prática para boa parte da população, em razão de dificuldades econômicas. A Lei Federal n° 6.766/79, com redação alterada pela Lei n° 9.785/99, por exemplo, faz referência às zonas habitacionais de interesse social, para as quais traça exigências mínimas mais brandas que a média (art. 2°, § 6°). Ao Município, portanto, é dado instituir zonas com regras especiais, quando o uso admitido vier a promover a integração das pessoas mais necessitadas aos espaços habitáveis.

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Concessão de direito real de uso

 

A concessão de direito real de uso ocorre por meio de contrato e está prevista no artigo 7P do Decreto-lei n° 271/67. Através dela o proprietário transfere a outra pessoa prerrogativa de usar seu imóvel, com as garantias típicas de um direito real. O instrumento se destina para fins específicos de urbanização, industrialização, edificação, cultivo de terra ou outra utilização de interesse social.

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Regularização fundiária

 

A regularização fundiária é o procedimento pelo qual se busca tornar lícita, isto é, amparada pelo Direito, a ocupação da terra nos casos em que o acesso àquele bem tenha ocorrido de modo irregular. Normalmente a expressão “regularização fundiária” é utilizada para designar a atuação destinada a revestir com maiores proteções a posse existente sobre determinado imóvel. Isso pode ocorrer mediante a instituição de um titulo de propriedade ou de outro direito real. Note-se que a posse é situação de fato com proteções jurídicas em menor grau do que as existentes para os direitos reais. Não há lei geral sobre o assunto

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